sábado, 4 de fevereiro de 2017

SÍNDROME DO PETER PAN... JÁ OUVIU FALAR?



Não sei se existe este síndrome como nome técnico...Eu dou-lhe este nome porque, para mim, o Peter Pan é o símbolo do menino que queria eternamente ser menino, que não queria nunca crescer. Na realidade, cada vez me deparo com mais adolescentes com exatamente a mesma sintomatologia....O não querer crescer, ou melhor, o não querer assumir o que crescer implica!

O “síndrome de Peter Pan”, como gosto de chamar-lhe, aplica-se aos jovens que continuam a comportar-se como crianças e que não são capazes de tomar a responsabilidade do crescer, as responsabilidades de ter de tomar de decisões, de fazer escolhas e de acarretar com as consequências das mesmas...

Perceber que os nossos atos tem consequências é cada vez mais difícil para os nossos jovens e é-o porque nós pais, cada vez temos também mais dificuldade em impor regras e limites consistentes, em responsabiliza-los pelos seus atos...

Atualmente são poucos os jovens que tem a noção de que antes de fazerem algo, têm de ponderar bem sobre a sua escolha pois ela vai ter consequências...”Faço e depois penso” , é a lógica da maioria dos nossos jovens, acabando por entrar numa “onda” de negarem-se a crescer, apresentando uma enorme imaturidade emocional.

Esta imaturidade está diretamente relacionada, tal como já referi atrás, com a falta de regras e limites consistentes e coerentes , pois, é através deles que as crianças percebem o meio como securuizante...Um contexto familiar onde os NIM´S (não que depois se transforma em sim) , são uma constante, geram no jovem insegurança e medo de não serem queridos e aceites pelos demais.

No entanto, é preciso estarmos muito atentos pois apesar desta insegurança, estes jovens acabam, na maior parte das vezes, por colocar uma “armadura protetora e defensiva “ que usualmente, lhes dá um ar de jovens seguros de si mesmos, tendo inclusivamente, por vezes, comportamentos arrogantes... É a sua mascara para ocultar as suas verdadeiras inseguranças e indecisões. Estes jovens escondem-se por trás de desculpas ou mentiras que os fazem dissimular a sua capacidade para crescer; por norma falam de fantásticos projetos, negócios incríveis que vão ter, etc.. Estas fantasias acabam por permitem-lhes iludir as suas responsabilidades e poder culpabilizar os outros pelas coisas negativas que lhes ocorrem.

São jovens cuja atitude predominante centra-se em receber, pedir e criticar, não se preocupando muito com o fazer, com o pôr em prática as suas coisas.. Isso faz com que vivam centrados em si mesmos e nos seus problemas sem se preocuparem pelo que acontece às pessoas no seu redor;

São jovens que consideram o compromisso como um obstáculo à sua liberdade;

São jovens que não adotam a responsabilidade dos seus atos, porque sentem que os outros devem fazer por eles;

São jovens que se sentem permanentemente insatisfeitos com o que têm, mas não tomam iniciativas para tentar solucionar a sua situação. De forma simples... São jovens que querem tudo mas não fazem nenhum esforço para o conseguir;

Geralmente, estas dificuldades têm origem numa fase de crescimento mais precoce, quando não conseguem sentir o seu meio familiar como estruturante e securizante, desde cedo, acabando por se irem sentindo, à medida que crescem, desprotegidos e angustiados.

Reconhece estes sintomas? Já os viu em alguma lado, nomeadamente no seu filho adolescente? Então está na hora de tomar uma atitude...Nunca é tarde demais para tomar atitudes...Deixo-vos algumas dicas:

- A melhor via para ajudar estes jovens a crescer é permitir-lhes que enfrentem a realidade e assumam as consequências dos seus comportamentos e decisões. Não os defendem se eles tiveram um comportamento errado...mesmo que o castigo dado na escola por exemplo, não seja justo...Justo ou não, foi a consequência da sua escolha que o provocou e é isso que é importante o jovem perceber – os nossos comportamentos têm consequências...umas vezes boas, outras vezes más...depende da escolha que, depois de ponderado eles fazem;

- Podemos ajuda-los a tomar escolhas ponderadas não pensando por eles mas antes ajudando-os a pensar. O dialogo continua a ser a melhor arma. Converse com o seu filho, ajude-o a perceber que na vida podemos sempre escolher pelo menos dois caminhos e que, para cada um desses caminhos existem consequências. Assim, antes de escolher um ou outro caminho é importante pensar nos prós e contras de cada um...Depois sim, tomar a decisão ponderada e fazer a escolha ciente das consequências da mesma;

- Quando o seu filho vem com muitas queixas e lamentos, nunca deixe de estar disponível para ele mas, não entre na onda do “coitadismo”...Motive-o a que tome iniciativas proactivas, para assim mudar a sua situação.

É claro que temos um pequeno Peter Pan dentro de nós ( eu sei que tenho), e pretender erradica-lo totalmente seria algo bastante difícil e até pouco saudável... É importante mantermos sempre uma "pequena" criança interior dentro de nós...O que não podemos é permitir que essa "pequena criança", esse lado mais infantil, nos impeça de crescer, assumir a responsabilidade pelas nossas decisões e continuar o caminho da maturidade.

Fátima Poucochinho
Psicóloga Infantil
Clínica ASAS, Portimão

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

CRIANÇAS "BOAZINHAS" VERSUS CRIANÇAS "MAZINHAS" …




"Ah…O meu filho é tão bonzinho…Não chateia nada…Faz tudo o que lhe peço!"

Todos os pais querem o filho “bonzinho” e, desgraçados daqueles que têm os mal comportados! É verdade…A nossa sociedade “implementou” os “filhos bonzinhos” e os “filhos mauzinhos”.

Os “bonzinhos” são os bem mandados, que fazem tudo o que os pais pedem.

Os “mauzinhos” são os desobedientes, que testam e quebram os limites a toda a hora, deixando os pais envergonhados porque educaram um filho “mauzinho” …

Sim, no imaginário social, todas as crianças que não fazem tudo o que os adultos pedem, sem contestar, são desobedientes, mal educadas e “mazinhas”.

Vou ter que ser “mazinha” e dizer que não concordo em absoluto com esse imaginário social…Atrevo-me a dizer que o acho uma seca!

Uma criança sem vontade própria, sem ideias, sem iniciativa, sem capacidade de argumentação é uma criança que não explora o meio. É uma criança que não se atreve a ir mais além e descobrir coisas novas. E uma criança que não tem “EU” e, em vez disso, tem um puzzle gigantesco dentro de si, com peças que não são suas, desorganizando-se porque, por mais que tente, elas não encaixam.

Uma criança pode e deve ter iniciativa e, pode e deve contestar algumas regras que não lhe fazem sentido. Só a partir daqui lhe pode ser garantida a possibilidade de perceber essas regras – Questionando-as!

Agora, não nos podemos esquecer que as crianças nascem com determinadas características de personalidade que condicionam o modo como fazem isso.

Umas crianças são mais reservadas e, por isso, mais propensas a aceitarem regras impostas e, outras, são mais extrovertidas e mais propensas a desafiá-las.

Entretanto, não nos podemos também esquecer que, apesar de não poder ser mudada, a personalidade pode ser moldada e, essa moldagem pode e deve ser feita pelos pais, no sentido de proteger e fazê-la sentir-se bem com ela mesma.

Assim, estamos perante uma situação onde temos de concluir que, o facto da criança ser “boazinha” ou “mazinha” não dependente nem só da criança, nem só dos pais…

Se temos uma criança mais inibida que tem pais muito castradores e rígidos, pois o resultado mais provável é que a criança fique ainda mais introvertida e, anule completamente a construção de si mesma, tomando uma postura semelhante à de um robot, ou seja, uma postura completamente comandada pelos pais
Se, pelo contrário, lhe calha pais permissivos, o mais provável é que se torne dependente destes, pois, dada a sua personalidade mais contida, serão os únicos com quem consegue estar sem ser completamente controlada!

Já se temos uma criança que é extrovertida e juntamos a ela uns pais extremamente permissivos, corremos o risco de nos depararmos com uma criança ditadora que faz o que quer, regendo-se pela permissa “Eu quero, eu posso, eu mando”, com todas as consequências negativas a nível pessoal, social e acadêmico que tal atitude pode acarretar.
Se juntamos, pelo contrário pais demasiado rígidos, corremos o risco de nos deparamos com uma criança birrenta, que não faz mais nada que não seja gritar, espernear e opor-se, fazendo da sua vida e da vida dos pais uma batalha constante.

Resta-nos o meio termo, que é a solução mais saudável para qualquer criança!! Deixar de dar miminhos? NUNCA, mas, sempre com regras e limites á mistura!

O diálogo e a paciência são fundamentais na educação de qualquer criança, de forma a que ela perceba que os pais estão disponíveis para ela e, dispostos a ajudá-la a perceber como funciona o mundo à volta delas, sempre respeitando a pessoa que ela é, ajudando-a, desta forma, a construir-se e a apreciar-se enquanto pessoa.

É que não é suposto, é as crianças fazerem tudo o que os pais querem ou mandam…O que é suposto é a criança dar a sua opinião, mostrar o que pensa, confrontar, por vezes, de forma a dar aos pais espaço para desempenharem a sua “profissão” que é ser educadores, é EDUCAR!

Fátima Poucochinho
Psicologa Infanto Juvenil
Clinica ASAS, Portimão

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

FAZ O QUE EU DIGO MAS NÃO FAÇAS O QUE EU FAÇO...



"...os pais estão proibidos de negociar, de justificar ou de explicar as regras que entendem que uma criança deve ter (e que, supostamente, têm tudo a ver com os seus bons exemplos).

Porquê?


Porque as crianças lhes tiram, desde sempre, as medidas até à alma. E, portanto, porque elas sabem muito bem quando é que os pais lhes estão a exigir comportamentos em tudo adequados aos seus bons exemplos ou, pelo contrário, quando é que eles se estão a esticar, exigindo um conjunto de atitudes que não têm nada a ver com aquilo que fazem.

Por exemplo: faz sentido que o pai exija que uma criança não se levante da mesa, durante o jantar, enquanto ele, por rotina, não deixa de o fazer, para atender o telefone? Isto é: se os pais exigirem, em função dos exemplos que dão, fazem muito bem.

Não se trata, é claro, de exigirem com maus modos e de forma carrancuda o que quer que seja. Mas, de forma firme e serena. Tudo menos fazerem-no a tremelicar da voz ou a pedir, muito devagarinho, que uma criança faça aquilo que, sensatamente, tem de fazer. E, é claro, sem se explicar, negociar ou justificar porque - ao fazerem-no como quem tem a obrigação de encher o discurso de alíneas e de demonstrações, a propósito de tudo e de mais alguma coisa (o que sucede quando os pais tentam fugir às más práticas - demasiado autoritárias - dos seus próprios pais) - o melhor que conseguem é pôr ruído nos bons exemplos que vão tendo e exercer a parentalidade tão a medo que, à cautela, uma criança tem nas birras um excelente controle de qualidade para a autoridade dos pais".

Eduardo Sá

O MEU FILHO FOI DIAGNOSTICADO COM AUTISMO…!


Inicialmente acredito que seja uma espécie de bomba que cai em cima de qualquer pai e mãe mas, quando a bomba desvanece e os pais começam a reconstruir o que foi destruído, o mais certo é acabarem por descobrir que, afinal, têm a seu lado uma criança maravilhosa que, simplesmente, vive mais tempo no mundo dela do que no nosso…

Deixo-vos com um pequeno excerto de um texto escrito por um adolescente que, em criança foi diagnosticado com autismo:

“Olá mundo

Quero dizer-vos que, ao contrário do que possam pensar, eu não sou uma versão avariada de vocês. Como tal, não preciso de ser “arranjado”, nem preciso que tenham pena de mim e dos meus pais.

Digo-vos mais…O mundo precisa de pessoas como eu. O mundo precisa perceber que ser diferente não é ser “anormal”. Porquê que as outras pessoas são as “normais” e eu o “anormal”? É que eu sinto-me perfeitamente normal…Às vezes sinto que até sou mais equilibrado do que a maior parte das pessoas…

Não se preocupem com os meus gestos, com a forma como falo, com a forma como socializo…Sou simplesmente EU…E eu gosto de ser EU!

Não é porque não encaixo no molde que o mundo fez para a normalidade que sou estranho ou esquisito…

Sou simplesmente EU… E eu gosto de ser EU!

Sim, eu tenho alguns tiques. Sim, eu ando sempre com um objeto que me transmite segurança e conforto. Sim, eu às vezes não sei comunicar da melhor maneira mas, tudo isto, é uma parte do que eu sou. E eu gosto de ser EU!

Sim, às vezes descontrolo-me e fico fora de mim mas é a minha forma de reagir a um mundo que às vezes me parece estranho e esquisito…E assustador…Às vezes o mundo parece-me muito assustador! Tem muitos sons, muitos cheiros, muitas coisas a tocarem em mim e, muitas pessoas a quererem tocar-me…

Eu não gosto muito que me toquem…É assim tão estranho? Isso não me torna menos boa pessoa e menos amigo…Sou simplesmente EU…E eu gosto de ser EU!

Sim, também não gosto quando as coisas que eu já sei como funcionam, de repente mudam. Fico meio perdido e, sentirmo-nos perdidos não é bom…É assustador!

Para mim é bem mais fácil ouvir a mesma música vezes e vezes sem conta, ver o mesmo filme vezes e vezes sem conta, repetir todos os dias a mesma rotina, as mesmas etapas, os mesmos passos. Sabem, às vezes não é mau de todo ter alguma coerência e consistência no que acontece no nosso dia a dia.

Para vocês não é assim? Não faz mal…Eu respeito isso. Cada um tem a sua maneira de ser, de estar. Devemos SEMPRE ser nós próprios e eu, eu gosto de ser EU!”

Tradução livre por Fátima Poucochinho

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

QUANDO A BARRIGA DOÍ ANTES DE IR PARA A ESCOLA…


Estas dores de barriga acontecem bem mais frequentemente do que se possa imaginar e, a frase “Doí-me a barriga… não posso ir para a escola” é referida por um grande número de crianças, desde as mais pequeninas, às maiorzinhas!
Por norma, é uma dor de barriga que passa no fim de semana e, volta na noite de Domingo, acabando por durar quase toda a semana!
É complicado para as pais que, às tantas, já não sabem o que fazer…Será que dói mesmo a barriga ou é fita????
Estas dores de barriga durante a semana antes de ir para a escola soam-lhe familiares?
Pois, são dores de barriga que tem um nome e esse nome é ansiedade escolar. Pode ter varias origens…
  • Pode ter acontecido algo na escola que perturbou a criança
  • Pode ser difícil para a criança separar-se dos pais
  • Pode ser porque a criança tem dificuldade em lidar com a frustração de não fazerem o que ela quer e como ela quer, optando por arranjar estratégias para “refugiar-se” no ambiente familiar onde consegue ter controlo sobre as coisas
  • Pode ser porque a criança é muito inibida e tem dificuldade em relacionar-se com os outros
  • Enfim…Pode ser por mil e uma causas.
Por norma, a criança até diz que gosta da escola, que tem muitos amigos lá, que gosta da professora, que ninguém lhe anda a fazer mal mas, a resistência para ir para a escola manifesta-se sempre que a escola recomeça!
Temos de ter em atenção duas situações:
  • Ou a criança está a inventar a dor de barriga como forma de conseguir ficar a casa, ou
  • Efectivamente doí-lhe a barriga e, para isso, não precisa estar doente, basta estar ansiosa.
Consoante seja o caso, consoante a estratega a adoptar com a criança para ajudá-la.
Se percebe que é a primeira alternativa, é muito importante não permitir que a criança fique em casa, pois ela assim vai acabar por perceber que “as dores” ajudam-na a obter o que quer.
É importante também trabalhar com a criança a questão da inteligência emocional, de forma a que ela, gradualmente vá aprendendo a lidar com a frustração e com a contrariedade, vá aprendendo a colocar-se no lugar do outro, entre outras importantes competências emocionais.
Se a segunda hipótese é a que acontece com o seu filho e, efetivamente ele não está a mentir em relação à dor de barriga, então falamos de ansiedade pura! Na realidade, por norma, um dos primeiros sítios que a ansiedade “ataca” é o estômago.
Independentemente de ser a primeira ou a segunda hipótese, é importante levar a criança para a escola SEMPRE!
Sei que não é fácil (também sou mãe) mas, mantenha na sua cabeça que o médico disse que está tudo bem por isso, não está a ser nenhum vilão ao levar a criança para a escola. Pelo contrário está a ajudá-la pois, o permitir que fique em casa só vai contribuir para que não resolva a sua ansiedade, fazendo-a aumentar cada vez mais.
Deixo-vos com alguns conselhos para lidarem com este tipo de ansiedade:
  1. O primeiro passo é fazer despiste clínico, ou seja, ir ao pediatra, fazer alguns exames e perceber se efectivamente é dor de barriga fruto de alguma virose ou, se é ansiedade
  2. Depois é muito importante que a criança sinta que os pais percebem o seu sentir, a sua dor pois, independentemente de ser dor de barriga fruto de ansiedade, a dor é igual à “verdadeira” dor de barriga. Explique à criança que percebe que ela está com dores e que a quer ajudar.
Tenha uma conversa com a criança sincera mas adequada à idade da mesma. Explique-lhe que o que ela está a sentir é ansiedade e, peça-lhe mesmo para desenhar como ela acha que será a ansiedade dela se a ansiedade pudesse ser uma personagem de uma história.
Explique-lhe depois essa personagem que se chama ansiedade só existe se for alimentada e, essa alimentação somos nós que lhe damos. A ansiedade quer ser ela a mandar mas, para isso, ela precisa alimentar-se para ficar grande e forte…”Sabes do que ela se alimenta? Alimenta-se dos teus medos por isso, quando não lutas contra eles, ela vai ficando cada vez maior e maior e, a dor de barriga também vai aumentando e aumentando.
Por outro lado, a coragem alimenta-se dos medos que são enfrentados. Por cada medo enfrentado, cresces mais um bocado….”
Ajude a criança a visualizar isto como se fosse uma luta entre ela e essa personagem…Ganha quem conseguir ficar maior!!!!
Será sempre importante consultar um psicólogo que ajude quer os pais (através de gestão de estratégias facilitadoras), quer a criança (através de sessões terapêuticas)

Fátima Poucochinho
Psicóloga Infanto Juvenil
ASAS,Portimão

sábado, 9 de janeiro de 2016

Já ouviu falar em Disfunção do Processamento Sensorial?



Sabemos que é através dos sentidos que a criança vai interiorizando informações e vai percebendo o mundo que a rodeia. Quando estes falham ou ficam "avariados", o acesso ao mundo fica perturbado, não possibilitando a correcta percepção e interacção com o meio.

Muitas vezes a criança é tida como mal comportada, mimada, birrenta, difícil mas, na realidade não se trata de uma questão comportamental mas sim sensorial.

O que isto quer dizer?

Quer dizer que uma criança com fragilidades a nível sensorial tem uma extrema dificuldade em auto regular-se e, o que acaba por acontecer, é que acaba também por não conseguir regular a intensidade com que sente as emoções e, por isso, do pequeno, faz uma tempestade, não conseguindo encontrar o meio termo para parar a escalada em que entra o seu organismo.

Facilmente, perante uma contrariedade ou perante algo que implica emoções mais fortes (quer sejam positivas ou negativas), a criança perde o controlo e, o seu comportamento mostra exactamente isso: um grande descontrolo e uma grande dificuldade em recuperar a calma e a organização interna...Quanto mais castigos, quanto mais a repreendem, mais o descontrolo se intensifica porque a criança precisa de ajuda para conter-se e não de mais estímulos descontroladores como gritos, repreensões e, por vezes, "palmadas".

Em função disto, é importante ter em atenção que nem sempre o que parece é e, nem sempre uma birra é fruto de crianças mimadas.

As crianças com disfunção no processamento sensorial acabam por ser vitimas das aparências quando na realidade apenas precisam de ajuda para lidar com a intensidade dos estímulos que recebem do meio

Trata-se de uma perturbação neurológica que tem a ver com uma incapacidade do cérebro para integrar os estímulos que recebe do meio envolvente, provocando um acesso ao mundo  desadequado e, não possibilitando a correcta percepção e interacção com o meio..

Revela-se de forma mais evidente, através de um comportamento descontrolado, por vezes descontextualizado perante as situações com que a criança se confronta no seu dia a dia. Tal acontece porque a criança reage de uma forma extrema às situações que, para os outros, parecem normais mas que, para ela, se tornam rapidamente intensas.

Para além deste sintoma mais "visivel", existem outros sintomas que raramente associamos ao comportamento disruptivo da criança. Deixo-vos com alguns...

Sensibilidade a determinados tecidos

Reacção negativa ao ser penteada

Ou tem muito calor ou muito frio independentemente da temperatura ambiente

Dificuldade em manter o equilíbrio, sendo muito "trapalhona", caindo muitas vezes, tropeçando ou fazendo as coisas caírem

Dificuldades a nivel da coordenação motora como o jogar uma bola, por exemplo

Agitação excessiva

Agressividade alternada com momentos meigos e carinhosos

Flutuações de humor frequentes

Dificuldade em lidar com a  frustração

Estar atento, enquanto pai ou enquanto educador/professor é meio caminho andado para que a criança se sinta compreendida...E estas são crianças que precisam mesmo de se sentirem compreendidas porque, nem elas proprias se conseguem compreender!

Para além disso, é importante nunca esquecer que se trata de um quadro neurológico e não de uma criança mimada, fruto de uma má parentalidade!

Fátima Poucochinho
Psicóloga Infanto Juvenil
ASAS, Portimão

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

A DIFERENÇA ENTRE CASTIGO E CONSEQUÊNCIA



Um castigo é bem diferente de uma consequência mas, muitas vezes, estes dois conceitos são erradamente confundidos…
O castigo faz com que a criança tenha medo.
A consequência faz com que a criança aprenda, através da experiência própria, o que queremos que ela perceba.
O castigo não tem relação com o que a criança fez mas, a consequência está logicamente relacionada com a ação tida pela criança, ajudando-a a perceber que errou e o que pode fazer para a próxima.
Por exemplo, se a criança não come a salada ou a sopa, a consequência pode ser não ter sobremesa. É uma consequência logica e está relacionada com o comportamento tido pela criança.
Agora, dizer à criança que fica sem sobremesa porque não arrumou os brinquedos, não tem qualquer sentido! O que tem a sobremesa a ver com arrumar brinquedos? Esta atitude é um castigo…Está longe de ser uma consequência, longe de ser algo que ajude a criança a perceber o que não deve fazer para a próxima e, que comportamento alternativo pode ter.
Para podermos usar a consequência, temos de ser consistentes, caso contrario, vamos contradizer-nos em frente à criança, gerando perda de confiança em nós e no meio à volta dela…Pior do que isso, se a nossa consequência rapidamente deixa de existir após uns gritos e choros mais altos por parte da criança, ela vai começar a entender que, quando chora muito, chateia muito, acaba por ter o que quer e, não vai aprender absolutamente nada em relação às consequências que os seus comportamentos podem ter.
Por isto, deve manter a sua decisão até ao fim ainda que o faça de forma controlada e calma, dizendo por exemplo: “Eu percebo que estás desejosa de comer a sobremesa mas, eu não ta posso dar enquanto não comeres a sopa”
A criança reclamar é normal mas, nós, os pais não temos de ceder por isso.
Também não temos de fazer a criança sentir-se culpada ou envergonha-la pois, desta forma, a criança vai interiorizar que ELA é má e não que o seu comportamento foi MAU.
Tendo em conta que o que queremos é fazer com que a criança modele o seu comportamento, não será grande ajuda fazê-la sentir que o problema é ela.
É que a criança não pode mudar a pessoa que é mas, o seu comportamento ela pode mudar, precisa é de saber que é isso que pretendemos que ela mude…
Quando nos centramos na criança e não no seu comportamento, o foco dela passa a ser a angustia de se sentir mal, de sentir má.
Para além disso, estamos a ensinar-lhe a fazer as coisas apenas para obter algo, algo externo a si, quebrando assim a capacidade da criança para desenvolver a sua motivação intrínseca.
Também, por vezes, arranjamos discussões e zangas que podiam ser evitadas se déssemos espaço à criança para efectivamente perceber as consequências do seu comportamento…Imagine uma situação onde, em pleno inverno, a criança diz que quer ir de manga curta para a escola.
O que lhe parece mais acertado…Chatear-se e dizer 1000 vezes que ela não pode por isto e por aquilo, a criança fazer birra e gritar, os pais acabarem por gritar também e ser um stress ou, deixar a criança sair de manga curta, experienciar o frio e ela mesma perceber o que lhe está a querer explicar?
Claro que convém sempre levar na mala um casaco quentinho para quando a criança perceber que não foi uma boa escolha a manga curta mas, é muito importante também que não seja sarcástica e diga “eu avisei-te”. Será bem mais saudável dizer à criança “é verdade, está mesmo frio não é? Se quiseres trouxe aqui o teu casaco…”
Desta forma a criança vai saber, através do experienciar as coisas, que não é boa ideia usar manga curta no inverno e, são estas aprendizagens que ficam…As aprendizagens que é a própria criança a processar…Quando somos nós a massacrar e a dizer que acontece isto e acontece aquilo e a mandar, a criança nem ouve entrando a 100 e saindo a 200!

Fátima Poucochinho
Psicóloga Infanto Juvenil
ASAS, Portimão